Das minhas reminiscências.

Das doces recordações de minha infância no lugar em que deixei enterrado o meu umbigo, trago com majestosa alegria o maior espetáculo que a natureza reservara para um horizonte tão limitado quanto aquele.

Nada poderia ser mais fascinante para mim do que observar o grandioso alvorecer, ver o sol aparecer aos poucos por trás da serra do Panatis era o máximo show da bela natureza para quem se acostumara desde cedo a olhar a mata cinza e o gado morto.

Quiçá, não fosse somente isso que me encantasse, na solidão do meu contemplamento ouvia o passo cansado do jumentinho que trazia leite e outros produtos do sítio Pejuaba para a casa de dona Ocília, minha vizinha. Essa cena ocorria diante de mim sempre que o sol mostrava sua primeira metade.

Além do cassuá quase sempre pesado o pobre animal trazia no lombo um menino barrigudo, assim como eu.

Pouco tempo depois quando o sol já se mostrava imponente ouvia-se ao longe, a voz de Filomena cantarolar:

La la li, la la li, la la lá
la la li, la la li, la la lá

Em outros dias quando cansava dessa nota entoava uma canção que me transmitia enorme alegria, ouvia com deslumbramento de criança em primeiro dia de circo:

A carreira da raposa
Ela é muito feia
o cachorro corre atrás
ela se arrupeia

Quando não acometida por aquela insanidade verdadeira, quando não atacada por sua loucura era dócil, gentil e alegre. Contentava-me observá-la caminhar saltitante como uma criança de sua casinha singela sem reboco até a residência de mãe cília, como chamamos a acolhedora dona Ocília.

Tudo isso aconteceu em meu coração como um tornado a moer meu peito quando ouvi alguém recitar uma outra doce cantiga de Filomena. Quando cuidava com maternal carinho de Gervásio de Júlio Fontes costumava niná-lo aos embalos dessa tenra canção:

Vavásio quer bem a memena
Memena quer bem a vavásio.

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